Esta é a parte 3
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Estávamos transando comigo de quatro sobre o sofá e ele de pé. Ele
metia muito forte.
Para me proteger, virei o rosto de lado para não bater o nariz com
tudo na parede. Porém,
acabei batendo a cara com tudo. Vi estrelinhas. Ele foi um pouco
agressivo, mas, por
sorte, gozou rapidinho. Meu cliente fingiu que gozou com a
"fia" só para eles saírem
rapidinho e a gente poder transar só os dois. Comigo, ele gozou.
Depois da terceira troca (não tive coragem de pegar a menina do
cara, apesar de
estar louca pra chupar ela), um carioca muito bêbado me puxou e
começou a falar que,
assim que me viu, lembrou do filme Perfume de mulher, e começou a
contar o filme todo.
Antes da terceira, paramos no labirinto. Tinha uma tia de uns
quarenta anos que estava
se amassando com o marido, mas chupando um cara. Uma chupadora
convicta: do nada,
aparece um outro pau e ela abocanha. De repente, começou a
aparecer homem de tudo
quanto é tipo e de tudo quanto é lado para ser chupado pela tia.
Pelas minhas contas, ela
chupou sete paus. Até pensei que o povo ia começar a tirar senha.
Até aí, tudo bem. Se
bem que eu, mesmo sendo a puta, nunca chuparia sete pau num swing.
Notei que a tia não olhava pra cima. Ela não sabia a quem
pertenciam aqueles
paus todos. Apenas ia pegando e enfiando na boca. Eu só prestava
atenção no naipe dos
caras: todos nada a ver, para ser bem-educada. Quem sou eu para
criticar alguém? Mas
confesso: fiquei assustada. Vai ver era sua fantasia. Não sei se
tive mais nojo da tia ou
dos homens. Homem é FODA! Homem, quando quer gozar, enfia o pau no
primeiro
buraco que vê pela frente. Só não enfia num buraco na parede
porque ela não geme.
Ainda não tinha chupado nenhuma boceta. Estávamos na salinha onde
entram apenas
casais e ela começou a tocar em mim. Depois, sugeriu que fôssemos
para um quarto
privativo. Nos chupamos muito, mas eu não consegui gozar.
Porém, ela gozou na minha boca. A boceta dela é do jeito que eu
gosto, bem
carnudinha. Com todos os relacionamentos que já tive trabalhando,
aprendi que só vão
me respeitar novamente como mulher no dia em que eu parar de fazer
programa. E tem
mais uma lição nisso tudo: quando isso acontecer, e eu conhecer o
homem da minha
vida, aquele com que vou casar e ter filhos, não vou contar que já
fui garota de programa.
Decidi: quero deixar tudo isso no passado. Esquecer? Não, isso é
impossível. Vamos
dizer que colocarei essa experiência toda de vida numa gaveta que
nunca mais vou abrir.
Com certeza vou morrer de medo de ele já ter me conhecido como
Bruna ou que
descubra de outra forma. Mas tenho que deixar claro: não sou uma
"madalena
arrependida”. Espero que com o Pedro seja diferente, pois eu o amo
muito e quero que
ele saiba me respeitar.
Uma das histórias clássicas de todo conto de fadas de prostituta é
encontrar o
homem que vai tirar você "dessa vida". Não é que
aconteceu comigo? Era um cliente de
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62 anos, viúvo e supercarente. Toda semana ele me procurava para
fazer programa, mas
quase nunca transávamos, era mais conversa (e isso é mais comum do
que você
imagina). Um dia, ele falou na lata: "Quero conversar muito
sério com você". Me disse que
o filho, com quem ele morava, ia fazer intercâmbio por um ano, e
ele ia ficar sozinho. Me
convidou para morar com ele e pediu para eu parar de fazer
programa. Ele bancaria tudo
o que eu quisesse: estudos, academia, roupas, ia me dar mesada,
desde que eu parasse
com tudo. Falei que ia pensar e realmente pensei muito. No fundo,
não ia parar de fazer
programa, mas ia fazer só com ele, também por dinheiro. Um único
cliente para o resto da
vida (dele, o que poderia ser muito tempo). Minha recusa não teve
nada a ver com ele,
que eu curtia de verdade, nem pela oferta generosa, pois ninguém
estava enganando
ninguém ali. Pô, eu saí da casa dos meus pais para ter mais
liberdade. Me prender a um
homem, sem ser por amor, era trocar uma gaiola por outra. Dourada,
sim, mas uma
gaiola. Sei que me daria muito bem nessa, que recusei a oferta da
vida de muitas garotas
que vivem como eu, mas também tive medo de que ele morresse e
jogassem a culpa em
mim. Acho que já vi muito disso em filmes e na vida real por aí.
Se não é todo dia que alguém resolve "salvar sua alma
guardando seu corpo", algo
muito comum, depois de fazer muitos programas com o mesmo cara, é
virar amizade.
Hoje, todos os meus amigos são meus ex-clientes. Meu melhor amigo
chegou a fazer
cinco ou seis programas comigo. E, em muitos deles, a sacanagem
ficou em segundo
lugar. Em seguida, passamos a nos falar diariamente, sem essa de
falar só para marcar
foda. Um dia, tive de deixar bem claro: "A partir do momento
em que nos tornarmos
amigos, acabou o sexo". Não dá, não rola. Eu não consigo
fazer sexo com os meus
amigos. Virou amigo, acabou a relação, garota de programa ciente.
Esse é o meu limite
pessoal. Fato interessante: um deles já tinha feito programa
comigo. Fato triste: cheguei
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em casa às cinco e meia da manhã.
Terça, 12
TERCEIRO PROGRAMA
Fui a uma festinha com três caras, eu e mais uma "prima",
mas um deles ficou só de
voyeur. Combinamos de nos encontrar no bar All Black e de lá fomos
para o apartamento
de um deles. Foi uma surubinha bem tranqüila. Primeiro, fiquei com
um no quarto.
Transamos um pouco e ele só gozou depois, no oral. Depois, ficamos
bebendo um pouco
e conversando com os outros dois na sala, enquanto a menina entrou
no quarto com o
mesmo que eu estava. Acabei deitando no sofá enquanto um me
chupava e, para facilitar,
o ajudei com o meu dedinho. E gozei gostoso. O outro continuou apenas
nos observando
sentado no outro sofá. Quando o "casalzinho" saiu do
quarto, fomos nós dois, então.
Transamos um pouco, eu cavalguei e ele gozou no oral.
Na rotina de uma garota de programa, o ginecologista tem papel
fundamental. É
fato que ele tem de saber que eu faço programa. Isso é questão
fechada. De que outro
jeito ele pode me orientar de verdade, me examinar com o rigor que
eu preciso para me
proteger? O medo da Aids é o maior. Faço meus exames a cada três
meses e sempre é a
mesma agonia. Sempre vou com muito medo. Sim, me protejo, uso
camisinha em todas
as relações... Quer dizer: quando o cara me come, sem chance de
engaiolar o passarinho
sem preservativo. Mas, no oral, confesso que me arrisco. Meu
médico me explicou que,
num oral, as chances de contrair são menores, mas estão lá.
Principalmente se eu tiver
uma pequena ferida na boca, que é coisa que a gente nem percebe
que tem. Sei lá, às
vezes, vou com a cara do cliente, me sinto à vontade, confio no
que estou vendo e caio
de boca ao natural. Depois, bate aquele arrependimento.
Não dá para saber se o cara tem alguma coisa só de olhar. Mas
nunca engulo. Até
deixo o cara gozar na minha boca, curto, mas não engulo
(raramente, vai). Eu diria que
cinco em cada dez das vezes eu caio nessa besteira de chupar sem
camisinha. Mas
quero cair cada vez menos. Cuidar do corpo sem cuidar da cabeça
seria bobagem, né?
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Saúde ok, cabelo ok (para inveja de um monte de meninas, meu
cabelo é liso mesmo,
não precisa de chapinha. Que sorte a minha, não?), pele hidratada,
unhas sempre bemfeitas.
Quando o "kit trabalho" está checado, me dou o direito
de ter um tempo para mim.
Toda segunda-feira à tarde vou à terapia. Engraçado, pois a vida
inteira convivi com
psicólogos. Agora, no entanto, é diferente. No começo, não sabia
quem é que eu estava
levando às consultas: a Raquel ou a Bruna. Hoje não está mais tão
difícil. Já passou
aquela fase de querer contar toda a sua história para o terapeuta,
que é a mais chata e a
mais complicada. Hoje, sempre faço um resumo da semana anterior,
mas falando de
como os acontecimentos afetam a Raquel, o que eu penso da vida,
meus planos. É óbvio
que, no meio de tanta conversa sobre mim, acaba rolando falar
também de clientes e de
programas. São coisas indissociáveis.
Sexta, 22
PRIMEIRO PROGRAMA
Molequinho, mas que já é gente grande e bem sussu. Rolou
afinidade. Programa
em clima de putaria. Fato engraçado: ele pediu para que eu desse
um tapa na cara dele.
Dei com dó. Não consigo bater nem que me paguem para isso. Fato
interessante: fui
"Bruninho"... Foi divertido e saí da rotina. No primeiro
tempo, quando comecei a chupá-lo,
ele de cara me pediu para fazer um fio terra. Ok. Esse, fiz sem
dó. Então, ele pediu para
que eu colocasse a cinta que tem um pau de borracha acoplado
(óbvio). Mas ele já tinha
perguntado pelo telefone se eu tinha, então não foi nenhuma
surpresa. Com o pau em
mim, me transformei no "Bruninho" e ele se tornou minha
fêmea. Não fizemos nada
demais. E ele nem desmunhecou. Apenas o comi "de frango
assado", enquanto ele batia
uma punhetinha. Depois, pediu para eu sentar na beirada da cama
para que ele sentasse
no meu pau e ele gozou assim. Acho que comi ele gostoso. Segundo
tempo: foi a vez de
ele me comer. Cavalguei, dei de quatro, mas ele gozou de novo na
punhetinha.
Tem cliente que fica com medo de me ligar por causa de preço.
Certeza que tem
menininha cobrando 300, 400 reais, mas acaba fazendo um, dois, ou,
no máximo, três
programas por semana, quando muito. Sei que, com essa tal
"fama" da Bruna Surfistinha,
poderia até cobrar mais. Mas gosto do que faço, não nego. Faz eu
me sentir desejada,
coisa que nunca fui. E, óbvio, tem o lado prático. Sou uma pessoa
prática: quanto mais
programas fizer, mais grana entra. Não perco tempo negociando
preço.
Um monte de caras fica chorando desconto, vantagens,
exclusividade. Não tenho
saco para nada disso. Da mesma forma que entrei nessa, sei que vou
sair. Não quero ser
puta o resto da vida. Trabalho para isso. Primeiro, me livrei de
cafetão. Não vou dar
metade ou mais do que ganho para ninguém. Sim, tem um lado ruim,
de trabalhar
sozinha, que é a insegurança. Atender em um flat ajuda um pouco. E
eu sempre fico com
o telefone do cliente - e confirmo se é dele mesmo.
- Me dá seu telefone. Se pintar alguma emergência, eu posso ligar
e desmarcar.
Como eles sempre marcam com algumas horas de antecedência, fica
sussu. Até
hoje, nunca tive problemas com clientes agressivos. Ainda bem, né?
Meu maior medo, no
fundo, é encontrar algum amigo do meu pai ou das minhas irmãs. Já
fiz programas com
caras conhecidos, colegas do Bandeirantes até (que não me
reconheceram, mas eu fiz
questão de contar:
- Eu me lembro de você de algum lugar, mas não é da putaria. Nós
estudamos
no mesmo colégio
Sozinha, trabalhando de segunda a sexta, faço de 25 a 30 programas
por semana.
Tem dias que rola até mais de cinco, mas também não é legal passar
muito disso. Cada
programa, aqui no meu flat, dura uma hora e, por 200 reais, faço
oral e vaginal. Se quiser
anal, já sobe para 250 reais (isso foi depois da minha
participação no Pânico, em junho,
quando resolvi aumentar um pouquinho, já que a procura aumentou:
antes, durante
muuuuito tempo, cobrava 150 reais e 200, respectivamente). Quantas
vezes der para
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fazer nessa uma hora. E não precisa pagar motel, flat, nada: está
tudo incluído. A menos
que o cliente queira ir ao motel ou queira me chamar no hotel dele
(aí, cobro o dobro, por
conta do deslocamento). Com esse jeito de trabalhar, já me permito
folgar nos finais de
semana. Com todo mundo não é assim? Por que com uma garota de programa
seria
diferente?
Mesmo encarando tudo o que faço como uma relação comercial,
confesso que já
tive pena de cliente. Lembro que pensei: "Pô, esse cara
economizou um tempão para
estar aqui comigo". Como eu soube? Ele juntou tudo em notas
de um real. Isso mesmo!
Acho que era troco de busão, disso, daquilo. Juntou 150 reais, em
notas de um real. Ele
ficou muito sem graça.
- Você se importa se eu pagar assim.
- Não, não me importo.
Aí, ele me entregou aquele bolo de notas e eu contei para conferir
enquanto ele
terminava de se arrumar. Na hora, senti um aperto. Imagina o
trampo para juntar tudo
aquilo. Só que, dar de graça, no way. Pena, pena, negócios à
parte. Outra coisa que
percebi nessa profissão é que ela também tem época de cheia e de
vazante. Já tinha
falado que, no começo do inverno, a procura aumenta. Pois é: no
final do ano também,
que é quando chega
o décimo terceiro. Do salário normal, não dá para tirar. Então, o
cara aproveita a grana
extra. Dá certo orgulho saber que o cara trabalhou o ano inteiro e
se deu de presente de
Natal um programa com você. Esses, até por conta disso, são os que
aproveitam melhor
a trepada.
Um lado interessante de ser freelancer é agir conforme suas
próprias regras e
convicções. Criar um padrão próprio de serviços. Lembra a história
das toalhas e dos
lençóis? Pois é, pelos clientes, e por mim também, higiene é
básico. Tanto que, aqui no
flat, tem uma toalha para cada cliente. Até brinco que, quando
parar de fazer programa,
não sei o que vou fazer com elas. São quase oitenta! Às vezes, eu
perdia o controle de
deixar juntar um tanto para mandar para a lavanderia e, quando ia
ver, não tinha mais
muitas limpas. O jeito era comprar novas. Virou coleção. Todas
branquinhas, pois fica
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evidente que estão limpas de verdade. O sabonete dos meus clientes
é líquido (acho
nojento aqueles sabonetes em barra cheios de pêlos grudados,
arghh, passando de um
cliente para o outro). Os lençóis, a menos que um cliente sue
muito ou suje de gel, eu
faço render ao menos dois programas, sem dramas. As camisinhas eu
providencio. A
menos que o cliente seja do tipo GG, que geralmente traz as suas
camisinhas de
tamanho apropriado.
Segunda, 9
QUARTO PROGRAMA
Repetimos a festinha. Os mesmos caras da outra vez. Só que hoje só
tinha dois, o
voyeur e o dono do apartamento. Hoje teve "festa no
apê". Infelizmente, o caubói não
estava... Como das outras vezes, a festinha foi tranqüila. Além de
mim, tinha de novo a
outra "prima". Enquanto eu fiquei com o voyeur na sala,
o outro Casalzinho foi para o
quarto. No começo, fiquei sem graça, porque o voyeur (que hoje NÃO
ficou só olhando)
nunca tinha feito com garota de programa. E digo mais: nunca tinha
pulado a cerca!!! Um
homem quase perfeito, né? Pelo menos até hoje... Ele me perguntou
se não pular a cerca
é bom ou ruim. Nem queiram saber a minha resposta. Ele foi todo
carinhoso comigo...
Primeiro ficamos nas preliminares durante um tempão. Depois, o
chupei e ele gozou
rapidinho. Ficamos esperando para fazer a "troca". O
outro saiu do quarto e já veio para
cima de mim de pau duro. Me chupou um pouco e depois me pegou num
papis e mamis
até gozar.
Tomei um baita susto. Numa noitada, eu estava numa fissura danada
e desatei a
cheirar. Nem tenho idéia de quanta coca eu aspirei naquele dia.
Até uma hora em que
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parecia que eu não estava mais dentro de mim. Meu corpo não
respondia. Minha
respiração estava estranha. Um gosto estranho subiu à minha boca.
Overdose. Me olhei
no espelho e me vi morta: sem cor, a boca seca, os lábios roxos.
Meu coração, de tão
disparado, parecia que ia explodir. Apaguei. Eu sou
espiritualista, pois acredito que, do
"outro lado", tem tudo o que temos aqui. Até hospital.
Quando acordei, jurava que estava
no hospital "de lá". Estava literalmente numa bad trz.
No meio daquela sensação irreal,
até hoje não sei se foi viagem minha, se eu vi, se sonhei, mas me
lembro de conversar
muito com um homem, que não sei quem é mesmo, que me dizia um
monte de coisas.
Inclusive para eu parar de cheirar pó. Não tinha nenhum homem por
lá, como percebi
depois que acordei de verdade. Desse dia em diante prometi para
mim mesma que eu ia
parar.
Com a cara limpa, fiquei firme na minha decisão. Foi difícil,
claro. Tive crises de
abstinência, sentia muita falta e achava que estava morrendo toda
vez que acontecia. A
Gabi me ajudou muito nessa época, me apoiou e me agüentou desse
jeito. Eu meio que
me internei em casa: parei de ir às baladas, pois sabia onde
encontrar cocaína facilmente
e não queria mais. Quando pintava aquela fissura, aquela vontade
louca de cheirar,
pensava na minha vida, naquele sonho (viagem ou alucinação), no
tal homem do hospital.
Lembrava que tinha entrado na vida de programa pensando em parar.
Mas cheguei a
gastar 50, 70 reais por dia aspirando quatro gramas de coca. Da
pura, a mais cara. Nada
de pó de giz ou de mármore. Era mais de 50% do que eu ganhava.
Dessa maneira eu não
chegaria a lugar nenhum. Ou, talvez, só no hospital do "outro
lado".
Após resolver parar com a cocaína, fiquei um pouco mais centrada
nos meus
objetivos, vi como tinha sido boba de cair nessa. Por isso que
tudo o que vem fácil vai
mais fácil ainda... Dinheiro "fácil" também vicia. E eu
não quero passar o resto da minha
vida fazendo programa. Juntando tudo isso ao fato de eu ser muito
prática, criei um plano
para me ajudar na disciplina. Eu chamo de "meta do pé-de-meia
dos quinhentos". Muita
gente acha que é juntar 500 mil reais. Mas não é bem assim.
No começo, quando saí de casa, achava que ia fazer programa pelo
resto da vida.
Com o tempo, vi que é um trabalho cansativo, física e psicologicamente.
Em 2004 surgiu
a idéia de parar de fazer programa, voltar a estudar. Na verdade,
caiu a ficha de que
preciso parar de fazer programa. Não sei quando, mas preciso parar
um dia.
Só que, para isso, tenho que ter algum objetivo, alguma meta.
Sentei um dia aqui noflat e
viajei alto, pensando em quanto custa um apartamento. Fiquei
fazendo várias contas de
coisas que quero comprar - e de quanto precisava para poder
comprar e me tornar "ex"
de tudo isso, somando o que eu já havia economizado. Daí, deu um
absurdo, tipo
quinhentos paus. Haja programa. Eu não tenho como conseguir isso.
Fui eliminando um
monte de coisas da minha "lista de desejos" e cheguei a
300 mil reais. Ganhar essa
dinheirama, a princípio, assusta, porque é muito dinheiro. Mais
ainda se a gente
considerar o jeito que ganho. Então tive a idéia de dividir esses
300 mil reais em cotas,
para amenizar - e eu não sentir tanto. A conta foi simples: 300
mil divididos por
quinhentas cotas seiscentos reais cada cota. Peguei uma folha de
papel e numerei de um
a quinhentos. Assim, a cada seiscentos reais que consigo guardar e
depositar no banco,
vou lá e risco o número correspondente da cota. Quando não tiver
mais o que riscar,
saberei que consegui os 300 mil. Na verdade, já cortei outros
itens da minha lista e baixei
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o total para 200 mil. Mas acho que, se chegar nos 100 mil, eu
paro, mesmo não
comprando apartamento. De qualquer forma, já tenho meus planos de
futuro. Tem meses
que consigo economizar até 8 mil reais. Parece que o futuro está
chegando.
Desse tempo, vou levar algumas "heranças": dois
piercings (um no umbigo, outro
no lábio inferior, O terceiro, na sobrancelha, eu tirei) e três
tatoos (o escorpião do meu
signo na parte de trás do ombro, o coração na virilha e uma frase
na nuca, que eu tinha
feito para meu ex-namorado - da qual me arrependo muito:
"Thanks Du". Quando o
namoro acabou, mudei para "Thanks Dad"). Além do que
"levo", tem coisas que deixei de
conquistar. Fiquei dois anos sem estudar, e a sensação de que
tinha esquecido tudo foi
inevitável. A certeza também. Antes, eu não gostava de estudar.
Mudei de idéia. Quero ir
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para a faculdade assim que tudo isso terminar. O supletivo eu
acabo em 2005 e, se
conseguir passar no vestibular, em 2006 vou para a faculdade de
Psicologia. Conheço um
monte de gente que nunca foi para a faculdade, mas que é
empresário e ganha super
bem. No entanto, tiveram "paitrocínio". Como eu não
tenho mais, me liguei que, para me
dar bem na vida, vou ter que estudar, querendo ou não, gostando ou
não.
Terça, 28
PRIMEIRO PROGRAMA
Hoje foi a terceira vez que fiz programa com eles. Hoje eles não
quiseram ir ao
motel e vieram no meu flat. Brincamos bastante juntos. Primeiro,
ela fez um strip rápido,
mas o suficiente para os três se empolgarem. Então, eu a chupei
até ela gozar na minha
boca. Bom, o que mais curti foi quando ela estava cavalgando nele
enquanto eu fazia um
beijo grego nela. Ah, também quando ela estava me chupando
enquanto eu chupava ele.
Transei um pouco com ele, mas, surpresa, eles transaram bastante
só os dois, comigo de
voyeur. Eu não gozei, embora ela tenha me chupado bem gostoso. Ele
também não
gozou, pois ficou "segurando". Já ela gozou muito! Umas
quatro vezes, pelas minhas
contas. Engraçado: todos os meus amigos, hoje, já foram meus
clientes. Com certeza
você não saca a amizade no primeiro programa. Como eu já disse,
com amigos eu não
transo. Nem pessoal nem profissionalmente, e deixo claro isso.
Alguns conseguem ficar
no fio da navalha: continuam clientes, mas chegam muito perto de
virar amigo, porém
sem virar. É gostoso receber algumas demonstrações de carinho
deles. Muitos ligam só
para saber como estou ou, quando eu não escrevo no blog, só para
saber se está tudo
bem. Ganho muitos presentes, também. Ganhei um CD que o cara
personalizou com uma
foto minha na capa. O máximo!
Outro dia, escrevi no blog que queria ler o Anjos e demônios e um
cliente trouxe o
livro para mim. Também é bom na Páscoa, no meu aniversário. No ano
passado,
comemorei meu aniversário em um clube de swing. Na época, eu
estava realmente
viciada nesse tipo de lugar. Poder transar com homens e mulheres,
gozar de montão,
aquele clima de putaria. Assumo que era um prazer pessoal. Tem o
lado baladinha,
dançar, beber e conversar, e tem, claro, o lado suruba. Mas não é
tudo no mesmo
ambiente (tem gente que acha que sim). Daí, pensei: "É meu
aniversário, eu curto o lugar
e tem um monte de gente que nunca teve coragem de ir no swing
porque acha que é só
inferno". Então, esse monte de gente que não tinha coragem
teve de ir ao swing naquele
dia. Na época, eu estava namorando e, lógico!, ele também foi.
Eu queria reunir tudo: meu aniversário, a curtição, realizar a
fantasia com meu
namorado lá dentro, e com meus amigos também. Fantasia realizada
(a minha e a de um
monte de gente, diga-se de passagem), presentão. Para quem não tem
coragem (mas
muita curiosidade), vou contar como é. Aqui em São Paulo tem um
monte deles. Só aqui
em Moema são sete! Na fachada, porém, é um lugar comum. Não está
escrito "casa de
swing". Como a maioria, eu imaginava que, logo ao entrar, já
se via um monte de gente
na suruba, pelado, transando. Na verdade, tudo começa como uma
balada normal: bar,
mesinhas, pista de dança. É onde rola paquera entre os casais, mas
sem putaria. Quando
você começa a se aventurar para os fundos da casa é que o bicho
pega. Para chegar aos
quartinhos, você passa por um labirinto (que nem todas as casas
têm): um corredor
escuro, bem apertado, que força todo mundo a se encostar, se
esfregar. Dá para tirar um
sarro gostoso, sem vergonha, pois mal dá para ver quem está ali.
Seguindo mais adiante, você chega nos quartinhos. Eles têm paredes
de treliça,
para quem está fora poder ver tudo o que rola lá dentro (ou o que
conseguir ver, pois a luz
também não é de estádio de futebol). Tudo funciona para que a
coisa seja mais tátil do
que visual. Apalpou, gostou do que pegou, libere geral. É uma
coisa de maluco: chega a
ter vinte casais transando ali, ao mesmo tempo. Para os casais
mais recatados, que
ficaram xavecando no bar ou na pista, geralmente há quartos
privativos para quem quer
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trocar com outra dupla apenas. O saco, nesses lugares, é que é
dificil encontrar gente
bonita. São geralmente pessoas casadas, entre 30 e 45 anos. Nem
muito novos, nem
muito velhos. Há várias casas que não permitem garotas de
programa. Eu mesma já fui
barrada em uma dessas. Supõe-se que a garota esteja lá pela grana
- e não pela tara,
pelo prazer. E eles não curtem isso: os casais estão em busca de
troca com outros
casais, casados de verdade.
Quinta, 31
SEGUNDO PROGRAMA
Foi um programa sussu, sem grandes lembranças. Depois que acabou,
ele me
falou que tinha prazer com o sadomasoquismo. Ele é sado, que fique
bem claro. Só que
não fala pelo telefone com a menina porque curte bater de
surpresa. Ele me contou que,
quando chegou aqui, não teve coragem de me bater.
- Você não tem cara de garota de programa. Você é meiguinha e eu
não tive
coragem de te bater. Vou marcar com outra amanhã só para bater
nela.
Ainda bem, já ouvi muitas histórias de meninas que passam por
apuros no
trabalho. Acho que, por pura sorte, eu não coleciono muitas
passagens assim. Uma das
coisas que mais me incomoda no meu trabalho é a hora de cobrar. Eu
tenho vergonha. A
ponto de, duas vezes, o cliente ter saído sem pagar - e eu, sem
cobrar. No ritual do
programa, a grana é o último ato. Isso, tipo consulta de
psicólogo. Para esses dois, tive de
pedir para a Gabi (que é quem atende meu celular e marca os
programas, pois nossas
vozes são mesmo parecidas) ligar e cobrar. Vexame, não? Um desses
"caloteiros
involuntários" voltou para pagar. O outro, que já estava meio
longe, ficou com os dados da
minha conta e fez um depósito. Gente do bem. Outras duas vezes
aconteceram no swing
um catalão de pouco papo (não só pela língua, mas porque era
caladão mesmo)
aproveitou que fui ao banheiro e se mandou! O outro eu até perdôo:
tinha bebido muito,
passei mal e dou razão a ele de não ter querido pagar.
É engraçado, pois essa coisa com dinheiro parece que teve um fim.
Depois de tudo
o que aprontei em casa, com meus pais, por causa de grana, levar
alguns calotes é uma
forma de "resgatar" tudo aquilo. Mas outras coisas
também "vingaram" minhas
aprontadas. Quando ainda estava na Franca, tinha uma amiga, a
Taísa. Ela era meio
vagabunda (no sentido de não gostar de trabalhar, mesmo) e não
ganhava muito dinheiro.
Como eu não tinha conta bancária, guardava meu dinheiro na gaveta.
Sempre saquei que
desaparecia dinheiro de lá, mas nunca acreditei que pudesse ser
ela. Mesmo depois que
fomos "saídas" da Franca e tivemos que trabalhar no
privê em Moema, e os pequenos
furtos continuaram, nunca tive coragem de encostar ela na parede.
Não queria perder a amizade por causa de dinheiro. Uma noite,
fomos a uma
balada na Vila Madalena. Na época, eu ainda cheirava. Além disso,
naquela noite, bebi
muito. Passei mal, óbvio. No banheiro, achei que ela estava me
ajudando, mas senti a
mão dela vasculhando meu bolso. Na hora, chapada, nem me atinei.
Quando fomos
pagar a conta eu percebi que meus 50 reais haviam sumido. Arrastei
a Taísa até o
banheiro, junto com outra menina, e revistei ela inteirinha. Nada.
Na base da força, fiz ela
tirar a roupa e surpresa, os meus 50 reais estavam enroladinhos
dentro da calcinha dela.
Foi a gota d'água. Ao chegarmos no privê, subi atrás dela no
quarto, achando que ela ia
me matar. Quase. Muito cabelo puxado, arrancado, unhadas, tapas.
Fechei o caso com
uma frase:
- Você tem inveja de mim porque eu trabalho e você não. Não tem
nada, não.
Amanhã, eu ganho outro dinheiro.
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Outra vez que perdi dinheiro ocorreu no primeiro flat. Eu tinha
economias de 3 mil
reais que simplesmente sumiram. A Gabi disse que, se fosse com
ela, ficaria maluca. Eu
nem quis saber se foi a empregada ou algum cliente. Quer saber a
verdade? Nem fiquei
triste. Acho que, de certo modo, terminei de pagar pelo que fiz.
Aqui se faz, aqui se paga?
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Pois é, chega desse papo, vou mudar de assunto. Acho realmente
muito bacana quando
o cliente desabafa comigo. Tem meninas que acham um porre ficar
ouvindo história de
cliente. Mas eu sinto que isso é uma parte importante do
"pacote" para aqueles homens.
Eles não vêm aqui só para despejar esperma. E eles contam coisas
que, muitas vezes,
não confessariam nem para os amigos ou a esposa. Há alguns que,
passado o susto,
chegam a ser engraçados. Um desses chegou aqui e me disse que
havia comprado dois
tijolos de maconha. Fiz cara de assustada (e estava mesmo). Ele me
pediu desculpas,
mas tinha de contar para alguém. Outra vez, o cliente fez questão
de dar a entender que
era o "fodão", bandido mesmo. No entanto a transa rolou
legal, sem sustos. Mas ao voltar
do banho, ouvi ele falando no celular:
- Não. Vê se ele morreu mesmo. Porque, se não morreu, a gente tem
de acabar
com isso.
Ele falava tanta gíria no meio que eu quase não entendia nada.
Fiquei olhando
bem para ele, e ele tinha cara de bandido. Sabe aqueles que
aparecem na TV no
noticiário? Comecei a chorar, mas sem ele perceber. Fiquei bem
assustada. Outras
vezes, o susto é outro. Eu curto tentar adivinhar como é o pau do
cara assim que ele
chega. Às vezes, acerto. Principalmente quem tem pau pequeno.
Engraçado, com esses
está na cara. Não sei explicar, embora acerte quase noventa por
cento das vezes. Já o
bem-dotado é sempre um enigma. Tem uns caras que chegam e você
imagina horrores.
Na hora do vamos ver, não que seja pequeno, mas não é o monumento
que parecia ser.
E há outros que, de saída, você não dá nada por ele. Na hora que o
bicho pega, surpresa!
Já cheguei a pensar "não vai caber". Se nem no teste da
boca passa (só entra a cabeça,
mesmo), imagina na boceta. Confesso que em certas horas o tamanho
assusta. Mas
sempre se dá um jeitinho. Pessoalmente, não me ligo muito na
estampa do homem ou no
"tamanho". Alguns clientes, claro, eu gostaria de ter
conhecido em outra situação. Sim,
me envolveria com eles, homens gentis, às vezes bonitos, outras
vezes não. Eu, como
todas as mulheres, sonhava com o homem ideal. O meu tinha de ser
fiel. Hoje, já desisti
de encontrar.
É o sonho do tipo impossível, mas quero um companheiro. Que me dê
carinho,
proteção - e que vai ter isso de volta também. Que tenhamos
cumplicidade entre nós. E
não faço, mesmo, questão de beleza. Ela não me importa mais.
Segunda, 9
QUINTO PROGRAMA
Cliente tosco, cavalo, mas tentou ser bacana. Definitivamente, não
rolou química,
muito menos afinidade. No começo, o programa foi em clima de
putaria, mas depois ficou
mecânico. Muito mecânico. Meu, eu fiquei com nojo dele,
principalmente da língua dele, e
quase chorei. Juro. Daí, respirei fundo e lembrei que quem está na
chuva é para se
molhar. Ele me chupou, mas eu não consegui gozar de jeito nenhum,
por causa do nojo
que eu estava da língua dele. Como ele demorou para gozar, dei um
jeito de contornar a
situação, chupei um pouco o cara e depois fiquei de quatro. Ele
gozou na minha boceta.
Pois é, nem sempre rola de tirar prazer do trabalho. Mas algumas
coisas que a
gente faz nos levam ao arrependimento. Não, não vou dar uma de
falso moralista aqui,
calma, acho que, nessa minha trajetória, mais na minha vida, a
única coisa de que me
arrependo é ter feito o bendito filme pornô. No meu prédio também
moram muitos garotos
de programa e alguns atores. Eu sempre encontrava alguns deles no
elevador e já vinha
aquele papinho:
- Você é bonita. Não quer tirar umas fotos para eu levar para a
produtora onde eu
faço filme?
Ouvi isso tantas vezes que acabei mandando as fotos para a tal
produtora. Eu
tinha consciência de que não eram filmes "de arte". Me
chamaram, e lá fui eu. Não foi
legal. Nem um pouco legal. É tudo muito artificial, tudo montado.
Pára toda hora, o diretor
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pede para parar, manda cortar. Difícil fazer alguma coisa natural
desse jeito. Você não
pode olhar para a câmera, porque tem de ficar o tempo todo olhando
para o bendito
diretor para ver os sinais que ele faz. Quando ele levanta a mão
assim, é para mudar de
posição. De outro jeito, é para gemer. Transar com um monte de
gente à sua volta e
prestando atenção às ordens do diretor é uma loucura. Foi
interessante porque fiquei
sabendo como se faz. Não foi bacana porque vi realmente que não é
nada daquilo que a
gente pensa que é. Também não foi legal por outras razões. Eles
pagam muito mal. Você
ganha pouquíssimo. Dá até vergonha de falar quanto eu ganhei
porque é miséria, mesmo.
Tá bom, foram 500 reais. Isso só acontece porque é no Brasil. Nos
Estados Unidos, é
profissão. O respeito é outro.
Sei que tudo que aconteceu na minha vida, a fama (sei, sei,
passageira), as coisas
boas e ruins, de certo modo ainda me assustam. Outro dia, eu
estava andando aqui
mesmo na rua em que moro, de óculos escuros, quando um cara passou
do meu lado,
encostou em mim (eu achando que era assalto) e falou:
- Com licença. Desculpe a pergunta, mas você é a Bruna
Surfistinha?
- Não, não sou.
- Ah, então, desculpa, eu me enganei.
Fiquei supersurpresa, jamais esperava que alguém fosse me abordar
na rua, me
reconhecer. Fiquei tão sem reação que acabei falando que não era
eu. Que bobagem.
Por outro lado, já aconteceu de eu ficar com um cara, numa troca
de casais em um swing,
e ele virar depois e dizer:
- Você é a Bruna Surfistinha, não é? Eu sempre fui louco para
fazer programa com
você, mas agora tive de graça.
Quis matar o cara. Brincadeira. O que mais me surpreende é que as
reações das
pessoas, na maioria das vezes, ao me reconhecer, é de
neutralidade, embora já tenha
ouvido risinhos enquanto eu passo em algum lugar. Mas sempre fica
a dúvida: será que
era de mim que estavam rindo, de mim que estavam falando? Tenho a
impressão que
sim, mas não sei qual o motivo. Não vou ficar na neurose por causa
da vida que levo.
Ficar imaginando que algum carinha está me paquerando por saber
quem eu sou. Sou
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uma mulher bonita. Não vou ficar pensando: "Ah, ele me
reconheceu e por isso está
dando em cima". É loucura demais. Prefiro deixar a vida me
levar
Às vezes, de madrugada, vou até o prédio em que meus pais moram.
Fico na
calçada um tempão. Na última vez, fui com meu namorado: meia hora
ali, bebendo,
enquanto passava o filminho na minha cabeça. Eu vejo o portão e
uma menina saindo
assustada, com a roupa do colégio, uma mochila com algumas roupas,
desnorteada, sem
rumo caminhando para o destino que ela escolheu. Lá de baixo, olho
as janelas de luzes
apagadas no apartamento em que um dia morei. Lembro do meu quarto
clarinho, das
persianas (nada de cortinas ou bichinhos de pelúcia, tenho asma e
rinite), dos móveis da
Babilândia (não queria móveis de "adulto") e da grande
bancada onde eu estudava e fazia
as lições de casa, e passava horas no meu computador ou vendo a
tv. Não vou até lá
esperando um encontro casual. Pelo horário, quero mesmo é não ver
ninguém. Não estou
preparada. Nem eles. Como meu pai reagiria? E minha mãe? Nós nunca
mais nos
falamos. Vamos nos encontrar um dia, claro, mas vai ser planejado.
Quando eu parar de
fazer programa, quero provar para eles que fiz, mas parei. Tomara
que isso facilite a
volta. Terminada a cerveja, dou uma última passeada pela frente do
prédio, olho ao redor
e vejo que muita coisa mudou. Inclusive eu.
Hoje vejo que tudo o que vivi era uma fase pela qual eu tinha que
passar. Sem
arrependimentos. Três anos que eram para ter acontecido assim:
putaria, drogas... Se
não fosse desse jeito, longe dos meus pais, talvez eu ainda
estivesse tomando
antidepressivos. E eles, nem sei. Por que foi bom? Por vários
motivos (eu sempre vejo o
lado bom das coisas). Desde o meu amadurecimento como pessoa, de aprender
a cuidar
e a gostar de mim, ao aprendizado de conviver com todo tipo de
gente, de respeitar o lado
de cada um. Antes, eu não respeitava ninguém. Se não fosse garota
de programa, nunca
aceitaria as diferenças das pessoas. Conheci todo tipo de gente:
boas e ruins. A melhor
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delas foi a Gabi. Por tudo isso, sei que fiquei menos egoísta.
Penso até que, se tivesse
sido mais paciente, dado um tempo, se não tivesse saído de casa, a
minha relação com
meus pais um dia ia voltar ao normal. Nada de Bruna, só Raquel.
Mas só a Bruna podia chegar a essa conclusão. Nunca a Raquel. No
ano passado,
fui visitar minha avó, mãe da minha mãe, que está numa clínica
geriátrica em Sorocaba.
Ela me mostrou um álbum de fotos. Entre elas, nenhuma do meu pai.
Mas havia uma de
minha mãe, segurando no colo minha sobrinha recém-nascida, que,
por motivos óbvios,
eu ainda não conheço. Não sei por que, mas resolvi pegar a foto
emprestada e tirar uma
xerox. Guardo essa foto na minha agenda. De certo modo, me
aproxima da minha mãe e
da maternidade. Eu penso nos meus filhos (quero ter dois: um
casalzinho, gêmeos, de
preferência). Me imagino uma mãe mais companheira, liberal. Sou a
prova viva de que
não adianta você prender filho, proibir. Tudo bem que os meus
filhos poderão sair e voltar
a hora que quiserem, desde que eu leve e busque. Ter vivido a
minha vida me mostrou
bem onde está a maioria das armadilhas do mundo. Eu caí em todas
elas.
Quinta, 21
Às vezes, paro para pensar no que fiz na minha vida, mas sei que
colherei os meus
frutos, ou até que já os estou colhendo sem saber. Hoje fiquei
relembrando todo o meu
passado, sem depressão; apenas lembrei com saudades e com carinho.
Se não fosse o
meu passado, acho que não teria me tornado a pessoa que sou, não a
puta que sou, mas
o meu outro lado, que poucas pessoas conhecem. É tão bom lembrar
das risadas em
família, das viagens, dos colegas do colégio, de tudo. Depois que
fiquei um tempão
assistindo ao "filme" do meu passado, que passou apenas
pelos pensamentos, limpei as
lágrimas e levantei a cabeça. Gosto de chorar porque me faz bem.
Quando este livro estiver lançado eu não estarei mais fazendo
programas. Não sei
qual o dia exato de outubro, só sei que será antes do meu
aniversário, o presente que me
darei. Quero que os meus pais saibam e entendam que tudo o que fiz
foi em nome da
minha felicidade. Para sermos felizes precisamos sempre abrir mão
de algo. Não dá para
termos tudo de uma vez. Tive a sorte de encontrar o homem da minha
vida fazendo
programas. Sei que não são todas as garotas de programa que têm o
mesmo final feliz.
Vou me aposentar, mas continuarei com o blog até o último dia de
minha vida.
Ainda quero escrever nele que "amanhã será o meu
casamento" ou que "o meu filho
nasceu ontem". E espero mais ainda que estes fatos aconteçam
com o Pedro. O
importante na vida é nunca desistir de buscar a felicidade.
Fim.

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